10 de junho de 2012

Iluminada

Desde que nos separamos, não só relutei a indiferença das suas feições como aceitei seus atos impessoais e incômodos, sendo-lhe agora franco. Partiu cada pedaço do meu minúsculo e intocável coração, desejando desbravar corajosamente ambientes desconhecidos. Provara da audácia ao se camuflar nos meus sonhos, retocando-lhe nos encontros para reluzir a máscara que mal cabia em seu rosto.

Senti que o meu mundo fosse cair, mas ao estremecer o mundo, vi o tamanho da sua queda. Gigante como a desgraça sobre as nossas cabeças, ergueu-se para acenar desculpas e promessas. Recusei o inflexível gesto de um rosto inexpressivo, incapaz de sentir a poeira comer seus lábios e aterrar seus sonhos.

Quis amar suas escolhas acima de tudo, mas só pude odiar minhas decisões acima de todos. Precisei do mínimo para se sentir completo, e ao seu lado precisei de tudo e nunca me senti satisfeito. 

Ousávamos, de vez em quando, adquirir propriedade quando transpirávamos diante de nós mesmos. Cego de toda sua deficiência e imune do meu desespero, encarava-me ofegantemente e costurava suas feridas com os retalhos do nosso tão vaidoso amor.

Só considero a naturalidade de suas desculpas como alguém que observar pelos cantos desejando o perdão de quem está lá fora, esperando que este despenque do céu caloroso e chuvoso, impregnando na sua mente a certeza de um mal passageiro.  

Fiz-lhe tantas vezes gigante para derrubar meus castelos e findar sua pátria de infidelidade. Falava comigo em termos, pausadamente, para assim poupar-me da pretensão das longas conversas.  Já degolava o meu corpo simbólico nas palpitações dos seus toques. Daí tornou-me recipiente para o desgosto de suas aventuras e depósitos de suas saídas, enquanto castigava minhas virtudes como quem recebia com fervor a anulação de um contrato.

Segurava suas verdades como tochas erguidas para iluminar noites, enquanto eu escurecia manhãs para vê-la valente mostrando-me o caminho da sua honestidade. Acendi uma vela, mas como não depositara tanto em mim, o vento reclamava e o fogo, descontente, abandonava o pavio no meio da dança. Encontrei caminho melhor nas suas mentiras. Daí afastou-me de vez, percebendo pela primeira vez sua cegueira.

Rogava por ti através de uma fé desconhecida, resmungando calado para um Deus ciente das minhas limitações. 

E você continua procurando uma luz no fim do túnel. Você continua procurando esclarecimento nas suas verdades sem saber que elas mentem para você. 

3 comentários:

  1. Todas as vezes que termino de ler um texto seu, eu coloco as mãos no rosto e penso: Como alguem pode escrever assim, tão pra mim?

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  2. Bom encontrar pessoas que se dão bem com as palavras.

    Flores.

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  3. Eu não sei exatamente dizer o que senti ao ler o seu texto, só quero que saiba que ganhaste uma nova leitora. Escreves de uma forma linda. Parabéns!
    Um beijo, @pequenatiss.

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